domingo, 25 de abril de 2010

Como já deu para reparar na data acima, hoje é dia 25 de Abril e eu não andei de transportes coisa que até tinha curiosidade em fazer... Ouvir aquelas discussões fascisto-comunistas das velhas que vão em pé sempre a dizer "ai, tenho as pernas tesas! isto é mais difícil do que fazer caminhada", pergunto-me "Mas porque é que as pessoas dizem coisas da boca para fora? Tipo: ai vou ter teste intermédio, preferia estar doente; mas se estivéssemos doentes sem ir a praia já dizíamos: preferia ter teste intermédio". A sério que tenho pena, tenho mesmo pena de não ter andado de transportes, tenho a sensação que teria imensa coisa para escrever hoje se tivesse andado...

segunda-feira, 19 de abril de 2010

83 (o habitual)

Para quem não sabe, o 83 é expresso (imaginem se não fosse!), e leva pessoas da suburbana Portela até às Amoreiras e vice-versa. Graças a Deus também, é relativamente novo e tem ar condicionado.
Costumo apanhá-lo na agora esburacada av. do Brasil em direcção ao meu lar doce lar. Hoje foi mais um desses dias. Hoje foi mais uma conversa de autocarro digna de sublinhar.
Como de costume, mulheres nos seus sessenta resolveram sentar-se nos lugares vermelhos. Entretanto um telemóvel tocou. Era para a senhora mais velha, bem mais velha, de um loiro inverosímil pintada. Sopunha-se ser a filha: "ahhh, filha, és tu... [...] mas não queres que leve nada para o almoço? ahhh, fostes às compras... e para o lanchinho? ahhh, está bem... com o menino, pois...".
Entretanto, a mulher com excesso de peso à sua frente recebeu também ela um telefonema. Esta era mais nova e a identidade do indivíduo que lhe ligou permaneceu incógnita: "pois, pois... eu hoje ainda tenho de ir à Baixa [...] estou com a neura..." e suspirava amargamente.
Entretanto, de lá de trás começou a surgir um burburinho. Rapidamente, no entanto, a voz de uma mulher da mesma idade que as anteriores, com uma franja à Beatriz Costa e uns óculos escuros faraónicos que lhe escondiam as rugas pálidas e os papos de velhice, fez-se ouvir. As suas palavras, contudo, continuavam imperceptíveis. Até que ela se levantou:
- É inacreditável como é que nesta miséria deste país há pessoas assim... Cagonas e cagões é o que são todos! A corrupção, a quantidade de pessoas que não paga as contas do telemóvel...!
A mulher com excesso de peso já desligara à muito o telemóvel e, por achar que tal comentário a ela não era dirigido ou simplesmente por estar demasiado envolta nos seus pensamentos e nos seus suspiros amargos, limitou-se a olhar para fora com os olhos de cansados de quem trabalha demais, cansados como duas botas velhas, como diria Woolf. No entanto, a mulher de cabelo inverosímil que acabara precisamente de desligar o aparelho, sorridente, tomou atenção às palavras da velha Cleópatra e fez-se ouvir:
- Olha esta, acho que a sua paragem já passou, umas estações para trás. Talvez seja melhor o motorista dar meia volta e entregá-la no sítio certo. Aliás eles lá no Júlio de Matos estão com vagas... devia ter ficado lá, no número 53 - e mais baixo para o senhor a seu lado - Eu respondo, eu respondo...
- Realmente, com mulheres como estas não sei como é que os homens aguentam... por isso é que cada vez há mais maricas! Eu se fosse homem também me fartava de mulheres assim...
- Pois, realmente parece-me que não saiu na paragem certa!
Entretanto, nos bancos de trás um homem começou a rir-se e a repetir "maricas, bichas" em voz baixa.
- Este país, que miséria, que tristeza, é só cagonas e maricas, é tudo o que este país é... lamentável! - continuava a lamentar-se a velha Cleópatra.
O autocarro tinha chegado já ao bairro da Encarnação e as portas abriram-se. A mulher faraónica saiu, para felicidade de todos, mas a de cabelo inverosímil continuou lá.
- Coitada - disse esta a passar pela velha mulher - deve ter algum problema com telemóveis.

domingo, 18 de abril de 2010

750 (o deprimente)

"Conversas de Autocarro" nasceu no incontrolável stress do 750 com destino a Algés.
Íamos em pé, naqueles dias em que saímos de casa só para dizer que saímos e em que a última coisa que queremos fazer é ter que dar o nosso lugar a duas crianças, o que acabou por acontecer... Discussões, palavras, zumbidos, buzinas, o barulho interminável do motor do autocarro, músicas cruzadas de iPods algures perdidos nas malas... Ela vira-se 'ai, estas conversas de autocarro... olha, era um bom nome para um blog'